domingo, 23 de abril de 2017

Fotos ocultas

Avesso à pirotecnia técnica na qual parece ter sido reduzida a linguagem fotográfica, encontrar o trabalho de Viviam Maier é um alento. Nelas não há nada além da pura fotografia: luz, enquadramento, dramaticidade, clima... Embora pareça pouco, não é! Maier, compulsivamente, paralisou sua existência. São muitas fotos que deixou como legado. Só de negativos são cem mil, além de registros sonoros em fitas cassete e filmes em super-8. Legado descoberto tardiamente. Sua vida pessoal é outro avesso ao clichê do artista celebridade. Trabalhando como babá, ocupação que lhe dava a possibilidade de sair dos ambientes fechados e vislumbrar a rua, Maier, com uma rolleiflex pendurada no pescoço registrou todas as contradições de nossas existências: Alegrias, tristezas, desamparo, solidão. Os negativos, que foram se acumulando em inúmeras caixas e malas, permaneceriam ali até ser tragadas pela inexorável ação do tempo, não fosse o destino (sempre ele), a tramar seu futuro. John Maloof, procurando fotos para um livro de arquitetura arrematou num leilão de antiguidades uma das caixas com inúmeros negativos fotográficos. Vendo a qualidade do material e pressentindo ter encontrado uma pérola em meio à lama, percorreu a trilha inversa até encontrar todo o material que não havia comprado naquele dia. Entrevistas e pesquisas, visando descobrir a origem daquele material, estabeleceram as conexões para remontar o grande quebra-cabeça. A partir daí o que se viu foi a revelação de uma arte até então latente. Viviam Maier nunca procurou mostrar seu trabalho. Poderia mesmo ser considerada esquizofrênica, compulsiva, esquisita? Pouco importa. Seu estranho anonimato e isolamento contrastam com a obra que deixou.



Caso semelhante de Milagros Caturla, uma professora espanhola que trabalhava com administração e que nas horas vagas era também fotógrafa. Assim como Viviam Maier, Milagros nunca se preocupou em mostrar sua arte e permaneceria anônima não fosse alguém, despreocupadamente, comprar seus negativos numa feira de antiguidade e descobrir o tesouro que tinha em mãos. E quantos artistas jamais tiveram, ou terão, no escuro do destino, seus talentos revelados? E isso realmente importa?



Fotos de Viviam Maier





































Fotos de Milagros Caturla







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